Já fazem mais de dois anos desde que o referendo para a saída do Reino Unido da União Europeia foi aprovado com 52% dos votos válidos, uma diferença de cerca de 1 milhão e 300 mil votos. Desde lá, inúmeras negociações foram realizadas, primeiros ministros foram trocados e extensões no prazo foram dadas para a tentativa de um acordo em que dois lados saíssem ganhando (ou não saíssem perdendo). Depois do dia 23 de junho de 2016 o Reino Unido nunca mais foi o mesmo, um desconforto toma grande parte dos Britânicos: E agora?
Em novembro de 2016, foram definidas as pautas de mais importância e necessárias para um acordo comum para a saída do Reino Unido da UE: Qual o valor da multa que o Reino Unido deveria pagar à União Europeia? O que vai acontecer com os cidadãos do Reino Unido que vivem em outro lugar da União Europeia e da mesma forma, com os cidadãos da EU que moram no Reino Unido e como evitar uma fronteira prejudicial as livres trocas entre Irlanda do Norte e República da Irlanda uma vez que essa se tornar a fronteira entre EU e UK.
Entre 2016 e 2019 Theresa May, a então primeira ministra do Reino Unido tentou por 3 vezes passar seus acordos pelo parlamento inglês. Os três acordos foram negados. O último, no dia 29 de março desse ano abre um novo período de crise entre os membros do parlamento. Em abril a União Europeia então estende o prazo para até dia 31 de outubro de 2019. Theresa May renuncia a liderança de seu partido e seu cargo de primeira ministra. Segundo o sistema parlamentarista o primeiro ministro é eleito pelo partido governante, o que levou somente os 160 mil membros do partido conversador as urnas. Com um total 0.3% dos eleitores totais do Reino Unido, Boris Johnson é eleito primeiro ministro do Reino Unido.
Pouco se foi apresentado ou debatido nos meses seguintes, complementando a posição de total omissão de Boris Johnson a qualquer comentário sobre o Brexit em seu discurso de inauguração no conselho da ONU em setembro. Tudo parecia estar encaminhado para a mesma estagnação de Teresa May e que necessariamente levaria a uma nova extensão do prazo final.
Nas ultimas semanas as negociações em Bruxelas ganharam um novo fôlego, os debates sobre a fronteira avançaram e foi apresentada uma solução em relação ao VAT (Value-added tax), uma espécie de imposto de circulação de bens e serviços e um dos maiores empecilhos econômicos sobre o acordo. Jean-Claude Juncker, presidente da Comissão Europeia anunciou nessa quinta-feira ao lado de Boris Johnson: “Estou feliz pelo acordo, mas triste pelo Brexit”, demonstrando uma resposta positiva as negociações — “Creio ser um acordo que beneficiará aos dois lados”.
Boris Johnson e Jean-Claude Juncker nessa quinta feira (17)
A grande diferença entre os acordos de May e o de Johnson é um novo capitulo entre as fonteiras da Irlanda e Irlanda do Norte, uma “não aplicação de nenhum tipo de checagens ou controle regulatório ou de infraestruturas relacionadas”. Em resumo, após o período de transição a Irlanda do Norte fará parte dos acordos e negociações externas como parte do Reino Unido normalmente, porém as taxas, impostos e regulações aplicados continuam as mesmos da União Europeia por um período de quatro anos, podendo ser renovado ou não por meio de votação dentro da Irlanda do Norte.
A empolgação por um desfecho é sentida, mas contida. Afinal, acordos já passaram também entre o presidente da comissão europeia e Theresa May em outras oportunidades. Conquistar a maioria dentro de um parlamento tão turbulento e dividido foi e continua sendo a maior barreira no avanço do Brexit. Nesse sábado, dia 20 o parlamento precisa decidir se aprova ou não o acordo. E foi aqui onde Theresa May foi derrotada as três vezes.
Atualmente a Câmara dos Comuns, é composta por 650 membros do parlamento, Johnson precisa de pelo menos metade deles para votar pelo seu acordo. O primeiro ministro possui 288 membros sendo 28 deles que votaram contra os acordos de Theresa May anteriormente. Mesmo com esses novos aliados ele ainda precisa de mais 37 votos. A decisão será apertada e definida em detalhes. Desde que o acordo foi anunciado e com uma possível abertura comercial próxima houve um aumento na especulação financeira que pode render pontos positivos entre os conservadores indecisos e liberais. Pelo outro lado, a vice-presidente do parlamento europeu Mairead McGuinness diz não confiar que um acordo passará — “Eu não estou muito confiante. Falando com meus colegas na Câmara é difícil deixar algo passar no sábado, isso que eles apresentaram é apenas um rascunho de acordo, não há tempo para analisar os detalhes”.
Assim como McGuinness só podemos especular, mas parece que essa caminhada que colocou em teste as estruturas centenárias da democracia está finalmente chegando ao fim. Resta saber agora as consequências disso em uma União Europeia dependendo de 75% de sua defesa vindo de países não-membros ou de um Reino Unido independente com grandes promessas de parcerias com a maior nação do mundo, os Estados Unidos. Finalmente, e em caso de um quarto acordo negado? Será que um novo referendo não traria — independente do vencedor — uma mensagem mais concreta e legitima sobre por onde continuar seguindo?
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